Um santo em forma de boneco

Para quem não nasceu ou não conhece Olinda e Recife, imaginar que um padre, um bispo, um homem santo, pudesse um dia ser materializado em um boneco-gigante, pareceria – talvez – quase uma heresia... Para nós, não! Absolutamente, não!
É aqui a "pátria dos bonecos", tanto os bonecos pequenos, aos quais chamamos mamulengos (de “mão molenga", por ser manipulado vestido como luva nas mãos que

se agitam, dando vida aos pequenos "seres"), como aos bonecos-gigantes, enormes, carregados sobre os ombros de homens experientes, que com eles frevam, dançam, seguem cortejos pelas ruas, ladeiras e becos da cidade alta, em Olinda, ou nas ruas do Recife antigo.
Bonecos são sempre bem-vindos! Crianças e adultos deixam aflorar o lúdico que guardam no coração, para enternecerem-se diante de pequeno títeres/fantoches, que criam vida através dos seus manipuladores, ou postando-se diante de um gigantão, com três metros de altura, saracoteando para lá e para cá, destravando a tristeza e reacendendo a alegria.


Essa aparição inusitada aconteceu em dezembro que se foi, pelo milagre da tradição popular e pela ousadia de abnegados "helderólogos", que quiseram dar "vida" ao boneco-gigante Helder Câmara, mãos para o alto, como a pedir por nós todos que por aqui ficamos, saudosos de sua presença material, de sua alegria carnavalesca (típica de quem nasceu num domingo de Carnaval, há cem anos passados).

O dom Helder-boneco veio para cumprir a tradição que tem sido mantida, e que transforma em gigantes as figuras que o povo amou, seja qual tenha sido a razão do afeto...
O dom Helder-boneco veio juntar-se ao cortejo onde já estão o mestre Gilberto Freyre, o compositor Capiba, o Batata (do Bacalhau do Batata), o sociólogo Betinho e tantas outras pessoas...

É assim em Pernambuco: os que partem, de certa forma permanecem conosco em forma de boneco-gigante, povoando os espaços com sua onipresença, sempre com o rosto alegre de quem viveu na paz dos justos e hoje contemplar a legião dos seguidores deixados.

Nosso dom estará conosco, para sempre, em nossos corações. E, para diminuir um pouco essa saudade, estará conosco agora sob a forma, volume e graça de um boneco, como manda a tradição pernambucana!
Texto: Marieta Borges Lins e Silva é pesquisadora e membro do Instituto Dom Helder Câmara (IDHeC)
Foto: Rodrigo Lôbo/JC Imagem

Fonte: JC online

Um comentário:

  1. Uma bela homenagem do povo pernambucano a Dom Helder Câmara, que além de tudo, foi umícone na luta contra a ditadura.
    Abraços

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